II LAWCN 2019

quinta-feira, 5 de março de 2009

As razões do combate à religião

Caros amigos,

Quase sempre quando eu defendo o ateísmo com unhas e dentes e critico a religião duramente, os crentes (aqueles que acreditam) me indagam qual é o problema de se acreditar em deus e se seguir uma religião, ainda que deus não exista e/ou que a religião seja um produto dos homens? Ou seja, por que se importar em combater a religião? Bom, existem várias razões pelas quais eu tenho para mim que religião é altamente prejudicial à humanidade. Várias delas já foram brilhantemente colocadas por filósofos do ateísmo como o genial Richard Dawkins em seu espetacular livro: Deus, um Delírio. Mas hoje surgiu uma notícia que tem o potencial de se tornar um exemplo didático nos manuais do ateísmo.

Trata-se do caso da menina de nove anos sistematicamente estuprada pelo seu padrasto em Recife e que dele engravidou após um de seus ataques. A menina carregava gêmeos e, por conta da idade, não teria quaisquer estruturas física ou psíquica para dar cabo dessa gestação. Família e médicos, natural e obviamente, optaram por realizar o aborto, salvaguardando, assim, a integridade da criança. Pois bem, o medieval (tal como alcunhado com grande propriedade pelo Arnaldo Jabor em sua coluna diária (05/03/09) na rádio CBN - veja abaixo) arcebispo de Recife e Olinda, o Sr. José Cardoso Sobrinho, resolveu excomungar, ou seja, expulsar da igreja, todos envolvidos nesse aborto mais do que justificado.

<<Removi o áudio do Jabor, pois o player começa a tocar sem a solicitação do usuário, atrapalhando a visualização de outras postagens, sobretudo aquelas com multimídia. >>

A violência da atitude do padre para com a menina é da mesma magnitude daquela do padrastro pedófilo, sobretudo se considerado que ela está sendo criada em um ambiente religioso. Se não, como poderá essa criança ter tranquilidade ao saber que seus familiares mais próximos e amáveis foram condenados ao inferno por tentarem protegê-la na sua integridade física e psíquica? Como ela deve entender que o ato de amor realizado pelos parentes e médicos gerou um destino tão cruel a estes entes mais amados, pois que, expulsos da igreja, eles não podem pedir perdão, pagar seus pecado e, portanto, serem salvos? Como poderá ela se redimir da culpa oriunda do fato de que, de uma maneira ou outra, ela é responsável pelo futuro flamejante nas mãos do Diabo em pessoal, de sua mãe, tios, tias, avós e sei lá mais quem além dos doutores?

Alguns poderiam dizer, mas isso não é a igreja, é a atitude do tal do padre. Mas isso é falso, pois que ele tomou essa decisão com base no dogmatismo e diretrizes de sua religião, a religião católica. Mais ainda, foi chancelado por seus pares que, em momento algum (pelo menos até agora) se opuseram ao ato da excomunhão ou mesmo, sequer se manifestaram contrários.

A minha esperança é que talvez esse fato faça a família repensar sua devoção, no caso dela existir, a essa igreja inquisidora e cruel, que mutila mentes e almas nas mais tenras idades. E a essa família eu só posso dizer, reafirmando e complementando o comentário do genial Jabor: fiquem em paz! Tenham a certeza absoluta de que o aborto foi um ato de amor sublime de vocês para com essa criança. Mais sublime ainda se vocês forem católicos praticantes ou evangélicos ou o que seja, por crerem que tal atitude pode lhes reservar uma recompensa nefasta e inevitável no pós-morte. Parabéns pela atitude inteligente e abnegada!

É por isso e muito mais que hoje eu repudio quaisquer religiões. Na verdade, eu sou um crítico até de religiões bem menos radicais, como o espiritismo. Pelo que vivenciei no meu tempo de religioso, todo esse evento seria tratado de uma forma bem mais branda e, devo dizer, inteligente. É difícil, se não altamente arriscado, saber o que os outros pensariam. Mas quero crer que todos os meus colegas daquela época espírita (ou a grande maioria) concordariam e apoiariam o aborto. Entretanto, ainda com a brandura do entendimento humanista superior do espiritimos, as ressalvas inevitavelmente surgiriam (e devem ter surgido nos grupos de discussão). Coisas como, apesar disso, se se tratasse de um espírito iluminado, a criança levaria a gestação até o final, confiando que deus compensaria a limitação física e/ou psíquica. Ou ainda, a criança tinha que passar por isso, por conta do seu carma de uma vida pregressa, envolvendo crianças, sexo e assassinato duma ou de outra maneira. Tenho certeza que mais cedo ou mais tarde vai aparecer uma psicografia (elas sempre aparecem a posteriori) dizendo as razões pelas quais todo esse imbróglio aconteceu à menina. Lá estarão coisas como, em outra vida ela abortou por vontade própria, ou ela, na carne masculina havia estuprado jovens, ela era enfermeira em clínica de aborto, ou qualquer outra coisa com o mesmo poder de dano à psiquê da criança.

Tudo fica muito mais fácil quando você diz apenas: infelizmente, você tem um padrasto criminoso e cruel. Isso acontece com regularidade maior do que gostaríamos. Mas é importante lembrar que a culpa é dele e não sua. Você foi uma vítima por conta da mera coincidência probabilística de sua mãe ter se encontrado e casado com esse sujeito sem escrúpulos. Mais ainda, sua mãe certamente fez isso inocentemente, sem saber da real virulência da mente desse indivíduo, pois que ela te ama imensamente. O aborto das tuas crianças é prova disso.

E ponto final. Recupera-se muito mais fácil e naturalmente.

Para ilustrar e mostrar o que eu penso hoje do espiritismo, veio bem a calhar o e-mail de um antigo conhecido meu que, recentemente, achou-me na Internet e entrou em contato comigo. Ele é um inteligente advogado o que o faz um espírita diferente. Peço licença a ele, para reproduzir alguns trechos de suas mensagens aqui. Após eu ter dado a notícia que não era mais espírita e sim um ateu convicto, ele me escreve assim:

"Entendo perfeitamente sua posição Ateísta, que é o mais lógico na posição de cientista, principalmente na sua área. Concordo com você, as Igrejas paralisam os Homens, pois são feitas por eles mesmos, egoístas e preguiçosos, e acomodados com o Poder, usando Cristo e as escrituras de acordo com seus interesses. E o Poder cega e vicia. Uma grave doença metal que leva massas a um controle, não passível de questionamento, pelo medo, irracional é claro. Tanto que nunca me liguei com Igreja nenhuma. Sempre fui muito questionador."

Comentário apropriado com precisão cirúrgica. Ele segue:

"Mas hoje, como espírita, lendo Kardec, compreendo de maneira lógica os questionamentos filosóficos que sempre tive sobre a vida."

Quando eu li o Pentateuco espírita pela primeira vez, também fui tomado por um fascínio e deslumbramento que me preencheram os vazios deixados pelas indagações não respondidas na superficialidade das outras religiões. Hoje como cientista, vejo que todas aquelas questões são bem melhor respondidas à luz da ciência profunda, não só pelas respostas às quais já chegou, bem como pelo seu método de indagação cética e crítica, buscando a resposta pela evidência factual e concreta. Ele prossegue assim:

"Não me ligo a fenômenos, sempre apreciei o ensino moral do Cristo, que me ensinou a Caridade, em seu sentido amplo, o amor em ação, apenas isso."

A esse comentário, adiciono a de outro amigo espírita, muito querido meu, que, tenho certeza que na melhor das intenções, tentou me trazer de volta ao espiritismo e à religião em um bate papo intenso, mas com respeito e carinho. Ao final, ele me mandou a seguinte mensagem:

"Fico feliz com as suas reflexões, para que cada vez mais o humanismo seja a sua maior meta! Buscarei, da minha parte, também buscá-la acima de tudo, porque fora da caridade não há salvação. Isso sempre será um elo que nos unirá! Procurarei, cada vez mais, ter um discurso equilibrado no centro, enaltecendo acima de todas as opiniões o Amor, como fonte de todas as alegrias. Se estamos certos ou não com nosso entendimento da vida, só saberemos no futuro, mas já poderemos estar certos nas nossas atitudes para com todos que nos cercam, naquilo que o humanismo tem de mais belo! É isso que todos nós precisamos, quaisquer que sejam as nossas crenças. Onde o Amor estiver, haverá felicidade! "

Essa mensagem me traz a tranqüilidade de que, se todas as religiões no planeta fossem como o espiritismo, o mundo seria bem melhor. Apesar de achar que seria ainda melhor sem religião alguma, tanto o advogado como o meu amigo espírita foram iluminadamente precisos aqui: o que importa é o amor, a solidariedade e a conduta moral e correta acima de tudo. Ou seja, carece o planeta de praticar o humanismo na sua mais ampla e profunda definição.

A minha diferença para o amigo espírita que vem a ser a minha mensagem ao amigo advogado, é que a religião, inclusive a espírita, tem o papel de ruído na divulgação e prática do humanismo. Humanismo independe de religião, é muito melhor justificada na ciência, e é mais completo e profundamente realizado quando está desligado da idéia de divindade e espiritualismo.

O que me faz lembrar de uma das oitenta frases do ateu:

"Two hands working can do more than a thousand clasped in prayer"

E aproveito para veicular um vídeo que acho que fará um bem ao amigo advogado:



Ou a sua versão legendada:



Enfim, teístas e ateístas, trabalhemos juntos pelo bem do ser humano e de sua extensão: o planeta em que habita.

Forte abraço a todos!
Vinícius



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